quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Roda-fortuna-destino

Seus traços de nanquim forte e fluido
traduzem rostos, sons e gestos frágeis,
dissonantes na forma,
intensos de serem o momento que impera.


É a fuga do cotidiano, 
na mescla intensa à busca de ver o mais fundo,
o que é denso.


Há tempos eu não dividia a mesma linguagem
do afeto clandestino, da roda-fortuna-destino:
toda a inconstância de ser só e livre,
toda a insistência em buscar completude -
virtude só da alma nobre.


Suas ferramentas: linguagem onírica, 
notas musicais de mil timbres,
vazio da troca não-tida, da vida sentida da falta de essência,
daquilo que reluz no breu...


E eu,
caos tão importuno, necessário na profundidade de encontro com o uno,
essência do que quer novo rumo -
o sumo e desejo de leve, completo
e da espera de ser.
 

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Sabbat da ENTREGA

Sensivelmente em transe. Estúpida, a dúvida. Nada a declarar: só sentir.
Era assim que se experimentava o movimento insólito da construção da entrega.
A ENTREGA...assim foi feito o convite para o mergulho.
E no meio da mata úmida, focos de luz branca
timidamente convidavam os pirilampos a um baile de fogo.
É, aquele mesmo, o das entranhas:
das entranhas entregues.

Fiquei estática com a percepção assombrosa de meu espírito, leve!
Quem diria...
O meu coração vagabundo agora vaga,
verso vira vereda,
viagem ciceroneada.

Olhos coloridos, líquido vermelho-limão,
amigos do coração,
agora não menos vagabundo:
quer ainda todo mundo,
mas já sabe ouvir um não.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Mais um caminho, uma próxima parada.


E daqui, desse ponto ainda não conhecido, para onde?
E daí, quais serão, nesse momento que há de vir, as convicções?


Esses dias mesmo estive conversando com uma senhora, colega do grupo das "Bandeirantes", do qual faço parte. A gente se reúne todas as tardes de terça, num espaço para criar artesanato, que é vendido e revertido em grana pro's projetos sociais que o grupo executa, em parceria com as comunidades assistidas. O assunto era: como eu me sinto estrangeira, como às vezes tenho vontade de viver coisas totalmente diferentes das que vivo.


Essa insatisfação já foi muito forte. Como se eu precisasse urgentemente dar um rumo novo aos acontecimentos da minha própria vida. E ficava incomodada com a lentidão das transformações, que no fundo não eram nada daquilo que eu imaginava ou pretendia viver.


Ela quis saber mais e eu dei alguns detalhes, quando vi estava numa reflexão em voz alta com alguém que nem conhecia bem, só do meio das linhas, agulhas, fuxicos, reclamações de doença, expressões de amizade...Ela é museóloga e eu nem sabia. E de repente fomos falando, costurando os desejos...


Minha interlocutora narrando os fatos de sua adolescência, dos passeios de bonde no Rio, de quando decidiu trabalhar numa época em que mulher era dona de casa. E sua mãe dizia: "estranho essa menina estudar tanto, vc não acha, fulano?" E o marido de minha amiga respondia:"deixa, D.fulana...Já ela cansa, enjoa..." E linda, ela disse entre risos: "não enjoei até hoje!"


Foi um barato.


O assunto na verdade começou quando eu apontei uma lata linda, antiga, de "Leite Moça", que estava cheia de carretéis em cima da mesa. Comentei, entusiasmada, que era apaixonada por objetos antigos, ao que me respondeu:"você devia ser museóloga". E depois soube que ela era.


E aí, pensei: meus interesses é que são muitos, é óbvio que não consigo viver tudo o que gostaria...Não chega a ser um distúrbio psi - hehe! - é o preço que paga o criativo. É o caso de quem sempre quer viver coisas novas, abarcar ondas, cheiros, sons, sonhos, luzes diferentes. E é bem característico da minha geração, embalada por Cazuza e seus exageros.


Hoje a ânsia já não é tanta. Já não dói mais pensar no que poderia. Já consigo encontrar graça no que poderá, brevemente.
E aos poucos a gente vai sendo bordadeira, museóloga, mãe biológica e social, cantora, produtora, namorada, fotógrafa.


Porque somos múltiplos.





quarta-feira, 24 de março de 2010

Brisa de fogo reluz

Brisa que sacode folhas,
das bem pequenas,
que faz com que dancem
pareçam pontos brilhantes de luz

Brisa, que em mim
lance fogo, só queime!
Brisa, que em mim
faz chover...

Inunda e anuncia:
bagagem de vento
invade o pensar insólito
e varre de mim o de dentro

Brisa que brilha as estrelas
Brisa que funde e conduz.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Adivinhação

De tantas coisas que vi e vivi,
delas lembro mais as sentidas.
Como aqueles raios de sol soprando a pele macia.
Parece que eles premonizavam
o quanto arder eu poderia:
de riso, de choro ou de chuva...
Mas nunca sem parar de arder.
Se caibo, ou se não,
só os raios sabem e podem dizer.
De mim, "eu só grito!"
Bem alto, bem fundo:
que o mundo permita-nos ser,
que só seja doce,
que eu e os outros que queiram ser muitos
possam só ser.
Isso, aquilo, bem mais.
E do grito, sussurro:
Que o futuro seja leve e claro.
Quais as cartas do baralho-destino
que se adivinham.

(out, 2002, Rua D. Candinha, Casa Amarela)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Sonho de Paz

À beira do mar tranqüilo
um dia estive com medo.
De ser plenamente,
sem culpa de intensidade que sente.

A doçura de olhar
invade o sonho esperado,
qual quadro pintado em mil cores
que doem, na força-traçado a bailar.

A busca por vida é palpável:
treme o suspiro que é novo,
invade a beleza mutável.
Manhã que já nasce doce.

E o que dizer
de quem nunca foi
além de ser só?

Compreende a linguagem
da pele de um filho a pulsar,
desejando tão bem o futuro?

Instantes congelam,
imensos, intensos...
Contrastam com o medo
de felicidade.

Sol que sempre nasce.
Lua, tão misteriosa!
Equilibra o sonho da paz...

(Para Miguel, maio, 2007)

Cadência do imprescindível

Se posso pensar o indizível,
o imprescindível é possível encontrar...
Nas ondas que desmancham, eternas,
deveras, posso flutuar.


Na maré insensata da busca,
sensatez vem e ofusca
a falha da falta que ruge
sentido do tato que emerge:
meus olhos correndo que fingem
contentar-se com o que está.


De estrelas do mar,
tão cadentes,
num céu escuro,
mergulho num brilho inquieto
de estrelas num teto,
em papel inseguro...


Coração, num pulo,adivinha:
bem bom, assim,
ser sozinha!



(Na solitude dos versos-canção, Godofredo, Rua 8, Planalto Central)